Era uma vez
uma cidade à beira mar. Tinha dunas, tinha Buggy, tinha um monte de coisa que não
serve pra nada, mas todo mundo gosta. Mas tinha uma coisa boa. Boa de verdade,
sem hipocrisia, enfim. Tinha. Tinha um povo, um povo meio feliz, meio reacionário,
meio bolsonarista, mas meio feliz às vezes.
Mas tinha o Beco,
ah... tinha o Beco, tinha o Samba. Cerveja, Loló, Brisadeiro? Quero!
Tinha uma galera que sempre se via, nem se conhecia, sempre se encontrava, mas
se via. Via sempre. Toda quinta, todo sábado ou toda quinta e sábado, mas
tinha.
- Boy, vai
querer pó hoje?
Quero não, mano,
quero nada. Quero curtir.
Olha ela lá, a
negra. Linda.
Também tem o
ex da ex, a ex com outro, a futura desconhecida que amo sozinha, tem ela com
outro também, tem ela com outra, olha! Tudo. Tudo tá lá. Não! Tudo tava lá.
Hoje mais nada, nem eu. Não estou, nem fui, ninguém está ou foi. Só o vírus
vai.
Não tem samba,
não tem alegria, não tem Devassa por 4? Tá caro, perto de Neide é 3. Não tem
mais nada.
Meladinha? Tem
não, amigo. Nem tenda eletrônica, nem vômito no Uber e o Uber reclamando que
preferia vômito do que nada. Nada. Só vírus.
Como me viro?
Saber!?
- Mano, tudo tá
voltando, o Beco vai voltar.
Vai nada.
Agora não. Não tão cedo. Duvido este ano. Nada. Nada não. Nada mesmo. Nada do
mesmo jeito. Será que um dia volta? Claro que volta. Volta mesmo? Vota sim. Sei
lá. Muito tempo. Qual ônibus é mesmo? Quanto dá o Uber? O quê? Vocês não vão
rachar? Vamos, eu pago. Não? Ninguém tá indo? Só o vírus mesmo? Real? Real e oficial?
Real e oficial!
Poxa era assim
que ela dizia, era assim a sua gíria.
- É, mano, mas
nem ela tá lá!
E tá onde?
- Eu sei lá.
Tu não sabe! Não sabe?
Sei não.
- Mas e a
senhora?
Que senhora?
- A senhora
que te acompanha desde o nascimento?
Ah, tá aqui
ué?
- Ela tá lá no
Beco também?
Claro. Vai
sempre comigo onde estou. Desde que o samba é samba.
- Verdade. E
você gosta?
Sei lá. Acho
que não. E que vou fazer?
- Sei lá. Tu
sabe?
Como?
- Sei lá. Tem
saudades?
De que?
- Do Beco e
dela, ué.
Claro. Do Beco,
dela, da senhora. Tenho saudade de tudo.
- Mas ela
nunca vai voltar e a senhora tá sempre contigo.
Sei lá, cara.
É assim. Pronto.
- E tá apavorado?
Não mais. Só
triste mesmo.
- Há. Então tá
bom. Conta mais então.
Era uma vez
uma cidade à beira mar. Tinha dunas, tinha Buggy, tinha um monte de coisa que não
serve pra nada, mas todo mundo gosta. Mas tinha uma coisa boa. Boa de verdade,
sem hipocrisia, enfim. Tinha. Tinha um povo, um povo meio feliz, meio reacionário,
meio bolsonarista, mas meio feliz às vezes. Tinha o Beco...
Rodrigo Slama 22/08/20
*Imagem do Google