Pavão artificial

 




Começou com um bóton. Assim, ficava menos ruim ter que andar com a coleira de identificação na empresa. O primeiro pin foi um prêmio aos membros do melhor time do semestre. Arrasaram nas vendas. O líder teve a ideia e a premiação estava lá no pescoço dos seus liderados. Depois, uma colega colocou um broche de sua banda favorita. Como assim, ela tem dois enfeites e eu só tenho um, pensava. Foi lá e comprou um mimo para si e seu crachá. Um meme, redondo com alfinete, sobre a sua profissão. Os colegas repararam, começou a receber elogios e empolgou-se.

          Suas redes sociais, timidamente, começaram a ser preenchidas de fotos, vídeos curtos e, principalmente, bumerangues que mostravam seus bótons, agora, cinco. Quanto mais engajamento gerava, mais pins colocava. Quase diariamente, acrescentava algo no cordãozinho. Viciou-se, não se sabe se nas curtidas ou nos enfeites, e logo teve de enfrentar um problema: não havia mais espaço na sua cordinha de pescoço.

          Até aí era um pouco exagerado, mas tudo bem. Estava mesmo perto do Natal, divertiria os colegas com sua guirlanda a tiracolo. Não obstante, a angústia o perseguia. Não poderia ser mais um vendedor do time. Já estava na elite entre os vendedores, mas quando se é mais um em meio a todos, você é apenas um qualquer. E agora? Praticamente todos os dias comprava ou ganhava um novo adereço... Teve uma ideia! Lembrou-se de Up: Altas Aventuras e passou a ostentar uma bela faixa de escoteiro.

          Risadas contidas o encontravam, mas ele não se abatia. Sempre de cabeça erguida farejando estrelas, olhando esperançoso por deuses do espaço sideral, sabia que todo desdém era filho da inveja. Não só na sua sucursal, era o maior portador de balagandagens de toda multinacional. Talvez em alguma filiam da Índia alguém usasse mais apetrechos, mas logo logo este sulista asiático seria alcançado. Chegaria ao Guinness, certeza!

          A faixa logo encheu. Por cima dela, veio um colete. Mas não parou por aí. Começou a prender em boné, na lapela. De uma hora para outra, todo seu terno e gravata, colete interno, faixa de escoteiro, colete externo e, claro, o crachá estavam lotados. Nada disso, no entanto, acalmou seu apetite por enfeites. Inspirado e determinado, resolveu que usaria uma capa, como os cavaleiros medievais. A capa, no entanto, tinha uma sobra de oito metros. A Lady Di ficaria abismada. Assim que preencheu tudo, inclusive o lado interno da capa, já não motivava mais a inveja, a curiosidade. De nada adiantava andar com todo aquele peso. Ninguém entrou na pilha competitiva. Só ele. Tudo bem... triste, mas cheio de adereços, desfilava na passarela imaginária dos corredores de sua filial.



* Imagem gerada por IA

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