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Levante dos deuses famosos

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  No panteão dos que existem só na Terra, os deuses trabalhavam cada um com as suas demandas. Quase todo dia era sempre igual. Pedidos, agradecimentos, oferta de alimento, tempo, dinheiro... Hoje, não é mais como quase todo dia. – Esse pessoal não dá um dia de folga! – disse Buda. – Buda, deixe de pantin. Tá berrando de bucho cheio! – reclamou Jesus, um dos que tinham o maior serviço. – Relaxa, pessoal. Uma hora o sossego vem. – tranquilizou Hermes. – Vamos manter o foco na permanência, galera! – recomendou Oxalá. O fato é que Jesus e Alá trabalhavam vinte e quatro por dia enquanto tinha deus à toa. Era pedido o tempo todo. Ibisu trabalhava pouquíssimo e ainda tinha metade do dia pra descansar sem precisar ouvir ninguém. Tava um clima de injustiça e desunião. Tinha deus querendo sair da galáxia pra ter um pouco mais de paz, mesmo sem saber se existia outro planeta com rezantes. Jesus já estava de saco cheio. Dentro da sua própria galera no mundo tinha desentendimento. E...

O homem do intestino invertido

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  – Uma vez eu conheci um homem que tinha o intestino invertido. – É o quê, criatura? – Sim. Ele tinha o intestino invertido. Era tudo ao contrário ali. – Como foi isso? – Tinha sido atacado por uma ema. Eu nem sabia que emas podiam atacar alguém... mas são como galinhas gigantes, né? Às vezes, galinhas atacam mesmo. Daí, levaram o cara para o primeiro hospital que viram, né? Foda que o médico que tinha lá não entendia de ataque de emas... e dizem, a galera toda de lá, sabe?, que ele era viciado em remédio de malária. Passou um tempo, há muito tempo, lá no Norte... na falta de tóxico começou a tomar aquilo. Era o que tinha, né?   – Homi, deixe de enrolagem e conta logo essa história! – Sim... aí o médico lá, chega tinha a boca torta de tanto remédio de malária, viu o sujeito de bucho aberto. Tava uma coisa feia, tudo sujo, tudo cagado, tudo cheio de baba de ema... – E danado galinha baba, caboco? – Rapaz, foi minha prima enfermeira lá que disse que tava tudo um...

Lyudmila

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  Fazia dias que Ana não dormia direito. Parecia viajar, se desdobrar para uma guerra. Ela nem gostava de ver filme de guerra, nem muito de filme ela gostava. Acordava cedo todo dia. Molhava a calçada como se a escassez de água não fosse um problema. Geralmente, caminhava até a pracinha a três quadras de casa... ficava lá uns minutos e, às vezes, levava até um pãozinho duro pros pombos. O clima andava seco no Planalto central... se comprasse o pão de manhã ele já estava duro à tarde. Em casa, todo dia ela, ela fazia pequenos serviços domésticos. Não mexia mais no fogão porque suas mãos não estavam tão firmes e há dois anos ela se queimou derramando água do macarrão. Lia um pouco, rezava a Prece de Cáritas e meditava para que o Dr. Bezerra de Menezes ajudasse a curar a pandemia no mundo e, principalmente, no Brasil. Kardecista e conservadora, Ana votou contra o PT nas eleições. Ela não aguentava mais a roubalheira. Não estava gostando muito do presidente que ela elegeu, mas... Na ...

Amarga Odontíase

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    Infelizmente, terminou a pandemia. A gente já pode sair sem máscara. Ninguém usava mais máscara mesmo! Um bom bocado de vacina deu certo e logo a imunidade da população mundial chegou a padrões seguros. Enfim o normal voltava. O velho normal, com bar, escola, terreiro cheios. No Rio de Janeiro, as escolas de samba preparavam os carnavais, os maracatus ensaiavam em Pernambuco e o Amazonas prometia uma Festa de Boi como nunca se viu. Mas Josefa se lamentava. Ninguém entendia direito e muito poucos desconfiavam. Pra ela, infelizmente, a pandemia tinha terminado. Com quase sessenta anos e poucos pés de galinha, mais do que a sua melanina, a falta de sorriso contribuía para a economia de marcas de expressões no rosto. Desde a adolescência, se acostumou a pouco rir, a pouco chorar, a pouco manifestar qualquer sentimento. Na verdade, Maria Josefa tentava não alimentar nenhum sentimento... bom ou triste, alegre ou ruim, nada que sentia era manifesto... tudo guardado, embal...

Fake Plastic Dicks

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  Foi a pandemia. Nunca gostei muito de computador, celular pra mim era pro básico. Pornografia então, jamais. Mas foi a pandemia, eu juro! Eu tinha um namorado, ficamos sem nos ver por quatro meses. No início, ah, no início foi duro, mas me acostumei. Me acostumei comigo, me acostumei com o sexo virtual, meus dedos, meus brinquedos que chegaram atrasados do Mercado Livre. Aí todo mundo começou a relaxar. Estavam abrindo bares, estavam abrindo igrejas. Estavam, olha!... Estavam abrindo shoppings! Tu acha? Eu deveria encontrar o Maurício. Já eram cinco meses incompletos de isolamento. Eu nem sabia mais qual era o seu gosto. Nem meu gosto em sua barba, só meu gosto nos meus dedos. Aqui em casa era foda. Meus pais, mesmo liberais, viviam em casa. E ainda tinha Vó Petra, não, na boa, não rola. E eu sabia que queria soltar todos os gritos e gemidos sufocados pelo isolamento. Na casa dele era foda, ele morava com o pai, bicho alcóolatra, sabe, rolava não. Motel? Cê tá doido? ...

Pastor 05 – Cloroquina e Deus

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As igrejas abriram, mesmo com a pandemia. E o pastor não demorou para convocar os irmãos. Mandou avisar que seria expulso quem não fosse ao primeiro culto depois do decreto.   – Irmãos, graças a Deus, a governadora satanista derrubou o decreto que impedia a obra do senhor de continuar, amém? – Amém! – respondeu a igreja em couro. – Irmãos, podem retirar a máscara. Tenho aqui comigo um remédio abençoado para acabar com esse vírus chinês, amém? Todos os seis fiéis que ainda se protegiam retiraram a máscara, menos o irmão desconfiado. – Irmão, sempre você querendo questionar os mistérios de Deus. Venha aqui na frente, irmão. Venha aqui! – assim que o irmão chegou, o pastor colocou a mão em sua cabeça. – Me diga, abençoado, por que você ainda está com essa máscara? – Porque o vírus ainda está circulando, pastor. Acho melhor mantê-la. – Em o nome de Jesus, pode me entregar a máscara, amém. – Pastor, o senhor me perdoe, mas eu acho melhor ficar com ela. – Irmão, você ...

Pastor 04 - mostarda contra o Corona Vírus

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Depois da live do culto, um irmão veio procurar o pastor no grupo do WhatsApp da igreja. Irmão: – Pastor, estou com uma dúvida. Pastor: – Pode perguntar irmão. O senhor me deu o dom da palavra. Estou aqui para responder suas inquietudes e as inquietudes de todos os irmão, amém? Irmã Vera: – Amém pastor. Irmão Sebastião: – Ame pasto Irmã Odete: – Ameim pasto Irmão Geraldo: – Amei pastor. Irmão: – Amém, pastor. A minha dúvida é a seguinte: a gente deposita os cem reais e recebe um caroço de mostarda que nos protege do vírus, não é isso? Pastor: – Amado a Bíblia fala que se a sua fé for do tamanho de um grão de mostarda, é suficiente para Deus. Amém? Irmã Vera: – Amém pastor Irmão Sebastião: – Ame pasto Irmã Odete: – Ameim pastou Irmão Geraldo: – Amei pastor. Irmão João: – Amém pasto Irmão: – Amém. Mas acho que é melhor seguir o recomendado pelos órgãos da saúde. Ficar em casa, se higienizar, sair só para o essencial e usar máscar...