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sexta-feira, 26 de abril de 2019

Conversas de chá


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Não é que seja careta, mas não frequento muitos bares. Não enfrentaria uma espera mortal pelo transporte público caótico do meu bairro, nem pagaria caríssimo por um taxi. Não é nem medo da Lei seca, mas, de fato, de verdade, sem hipocrisia, eu, realmente, não acredito que é legal dirigir após beber. Nunca fiz isso, e não estou muito disposto a testar a minha perícia etílica. Enfim... esta história se passa num café.
Na mesa ao lado, duas amigas conversam. Apesar de estarem numa das cafeterias mais legais, elas pediram chá e broas. Nem sei se chá combina com broas... só tomo chá como medicamento. Claro que, além de curiar o pedido, eu atentei os ouvidos para escutar um assunto que me interessa: religião.

– Teresa, você não sabe o que aconteceu esse final de semana. Gabriel está impossível.
– O que foi? – perguntou a amiga.
– Eu disse a ele: – Vá dormir que amanhã a gente vai cedo à missa. E ele respondeu: – Mãe, eu tenho dúvidas se eu quero ser mesmo católico, disse o filho.
– Olha só, Tereza. Olha o que esse menino me disse!
– O que você falou?
– Na hora, eu tive vontade de brigar, mas eu falei: – Olha, a gente pode sentar e conversar bastante sobre isso daí. – Isso é bem coisa do pai – disse mulher. – Gilberto já mudou não sei quantas vezes de religião. Eu sabia que isso um dia ia acabar acontecendo, mas ele só tem oito anos. 
– Mulher!... – espantada, a Teresa exclamou. 
– Você não fez a primeira eucaristia, Gabriel? Você não vai à missa comigo todo domingo? Você não presta atenção no que o padre fala?
– E ele disse o quê?
– Não sei, mãe. Não estou muito convicto – repetiu a mãe. – Vê se pode, Teresa. O que diabos um menino de oito anos tem na cabeça pra falar em convicção? Olha, nessas horas o padre Manoel faz falta... Ele ria saber o que fazer... agora estou enrolando pra continuar a conversa com Gabriel.
– Sim... o que aconteceu com o padre Manoel?
– Olha, o bispo não quis o padre mais na paróquia. Falou que, enquanto ele estivesse vivo, o padre não comandaria igreja nenhuma em sua região.
– E o que o padre Manoel fez?
– Mulher, ele é carioca, cheio de gírias, muito simpático. Agora, ele está numa igreja lá no Acre.
– No Acre?
– Sim... Encontrei com ele na Jornada Mundial da Juventude, no Rio. Ele disse que tinha sido perseguido pelo bispo... ele era muito divertido, as pessoas não iam mais às outras paróquias, aquela igreja sempre ficava lotada. Transferiram o padre por isso...  
– Vish...
                                                                                                                            

Rodrigo Slama 25/05/2015