Quarta-feira. Mês de junho. O Nordeste
comemorando seus santos, o Sudeste vindo pro Nordeste curtir as praias. Meio do
Ano. Todo mundo merece descanso, todo mundo precisa descansar. Eu dava aulas e
dançava quadrilhas. Comia milhos e cheirava cangotes no Beco. Tudo seguia e a
gente seguia também, sem muita escolha, sem ter muito o que fazer além de
reclamar em páginas de redes sociais para os nossos próprios amigos semidesconhecidos
e poucos desconhecidos que a gente mal sabia quem eram.
– Mataram Bolsonaro! – gritou um
aluno quase no fundo da sala e todo mundo começou a falar. Pensei em brigar com
o guri que estava mexendo no celular na minha aula e inventando história, mas
por que alguém iria inventar que mataram o presidente?
– Como é? – inquiri.
– Professor, acabaram de mandar
aqui. Mataram o Bolsonaro!
Saquei meu celular. Todos os
grupos em polvorosa. Um monte de gente comemorando, poucos lamentando, mas,
sim, tinham matado o presidente.
Não consegui mais dar aula
naquela quarta-feira. Ninguém mais conseguiu se concentrar no meu texto de
Saramago.
Saí para a sala dos professores. Boa
parte das turmas estava saindo, mesmo faltando ainda mais de 15 minutos para o
fim daquela aula.
– Dessa vez acertaram! – alguém
gritou da cantina. Na hora, não entendi. Sabia que tinha sido uma facada, mas
ainda estava meio perplexo com aquilo tudo. Não sei você, mas eu, particularmente,
demoro um pouco para processar certas informações... sobretudo porque,
infelizmente, fico tentando achar brechas que não foram ditas, possibilidades,
outras narrativas, enfim... eu ainda estava meio perplexo.
Era uma quarta-feira. Era junho.
Tinha gente com toras e galhos de madeira em frente às casas. Era interior... o
dia todo era gente soltando bomba, fogos... fossem vinte anos atrás, teria
balões, mas hoje não pode mais.
Aquele dia não teve mais aula.
Era impossível manter os meninos quietos. Na TV, só se falava nisso. Muita
gente preocupada com o que aconteceu, outras pessoas, em menor número, preocupadas
com o que seria? Nunca, no Brasil, alguém tinha matado um presidente. – E Tancredo?
– Não, desse jeito não. Tancredo não conta. – E agora?
– Olha, rapaz, não sei. Uma parte
de mim está feliz, outra está muito preocupada.
– Preocupada uma porra!
– Não sei.
– Bora beber!
– Beber?
– Beber, bora?
– Bora.
Rodrigo Slama
21/05/2020
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