Foi a pandemia.
Nunca gostei muito de computador,
celular pra mim era pro básico. Pornografia então, jamais.
Mas foi a pandemia, eu juro!
Eu tinha um namorado, ficamos sem
nos ver por quatro meses. No início, ah, no início foi duro, mas me acostumei.
Me acostumei comigo, me acostumei com o sexo virtual, meus dedos, meus brinquedos
que chegaram atrasados do Mercado Livre.
Aí todo mundo começou a relaxar.
Estavam abrindo bares, estavam abrindo igrejas. Estavam, olha!... Estavam
abrindo shoppings! Tu acha? Eu deveria encontrar o Maurício. Já eram cinco
meses incompletos de isolamento. Eu nem sabia mais qual era o seu gosto. Nem meu
gosto em sua barba, só meu gosto nos meus dedos.
Aqui em casa era foda. Meus pais,
mesmo liberais, viviam em casa. E ainda tinha Vó Petra, não, na boa, não rola.
E eu sabia que queria soltar todos os gritos e gemidos sufocados pelo
isolamento. Na casa dele era foda, ele morava com o pai, bicho alcóolatra,
sabe, rolava não.
Motel? Cê tá doido? Imagina se
alguém infectado usa antes da gente. Não quero adoecer. Vovó é idosa, esqueceu.
Tá bem, tá bem. Vamos pro motel
amanhã. Você passa aqui e me pega. Não, Maurício, não vou de Uber, você passa
aqui no seu Uber e me pega já que seu pai bateu o carro. Não. Já disse que não
vou pegar Uber sozinha pra ir pra motel. Não estou nem aí, o problema é seu.
Pernoitamos no motel. Foi uma
merda. Acho que Maurício esqueceu como se trepa ou então fui eu. Ele gozou três
vezes. Na terceira durou mais de meia hora, certeza, mas não faz diferença.
A gente ainda tentou outras
vezes. Eu fui enrolando também. Disse que tava com Covid, disse que tava com
enjoo, disse que tava com daltonismo.... Olha, eu enrolei como podia até não
poder mais.
Acabou a pandemia, mas não quero
saber de ninguém, na boa. Nem homem, nem mulher. Acho que fui eu, sabe. Acho que
foi a pandemia.
Sim. Foi a pandemia.
- Maria Tereza, encomenda pra
você!
Já vou, mãe. Peraí, não abre o
pacote!
Rodrigo Slama 26/08/2020