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A Tartaruga e o Pinto

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       As pessoas me perguntam por que não gosto de bichos de estimação. Eu nunca disse que não gostava de bicho, apenas não criava por ter sofrido bastante com os animaizinhos que eu tinha quando criança.         Minha primeira experiência foi com um pintinho... como eu gostava daquele pintinho, criava como se fosse um cão – talvez o comesse quando virasse um galo, mas, até então, era o meu melhor amigo.            Certo dia, minha mãe entrava em casa com sacolas na mão... doida para guardar logo as compras e acender seu cigarro. Avexada e bruta como sempre, ela pisou no meu pintinho. O tempo e meu estômagos viraram na hora. Aquela cena é, sem dúvidas, a pior da minha infância... e olha que eu vi coisa feia sendo criança no fim dos anos 1960. Toda tripa da pobre avezinha saiu de seu corpo pelo cu. Não pensei duas vezes... peguei uma caixinha de sapatos e levei meu amigo para uma benzedeira, tia Aladir. Insisti...

Pedro e a poça d'água

Estava cansado e com sono, caminhando numa rua deserta, quando, de repente, um carro passou numa poça e jorrou água suja em Pedro, que despertou definitivamente. Ele geralmente não prestava muita atenção em coisas como uma poça no chão, afinal, a rua era deserta e nunca passava carro lá. Assim que deu conta de que todo o uniforme estava molhado, Pedro resolveu voltar para casa e mudar de roupa para não ir todo imundo para a escola. Por sorte, ele estava ainda acerca de um quarteirão de casa. O garoto molhado estava decidido a tomar banho, mas estava muito frio para isso, então ele resolveu apenas trocar de roupa... Então secou o rosto e os baços, trocou de camisa e seguiu para a escola, já que estava indo mal em matemática, disciplina do primeiro tempo, e não podia perder uma aula a mais... sua mãe o mataria se ficasse em recuperação de novo. Três dias depois, assim que saiu do banho matinal antes da escola, Pedro olhou no espelho e percebeu que estava com manchas vermelhas nos ...

Palavrão e Boca Suja

            Eles nasceram em Goiânia, como toda dupla sertaneja tem que nascer, mas ao contrário das demais, eles não plantavam tomate, nem tinham que comer ovo cru, muito menos eram filhos de ricos fazendeiros e formados em odontologia ou algo do gênero.             Mirosrio e Durvalindo eram filhos de Francisca Joana, dona do cabaré mais famoso da grande Goiás, chamado Todarrô Lakiédura . Os dois cresceram em meio às putas, entre os bêbados e os errantes, aprenderam tudo que sabem naquele ambiente. A primeira palavra que Mirosrio aprendeu foi xoxota, ao passo que Durvalindo aprendia que chupeta não era um bico de borracha em formato de mamilo que serve para enganar o bucho do bebê.             Durvalindo ganhou um violão da mãe ao fazer cinco anos de idade, um dia depois do aniversário de seis anos de Mirosrio, que g...

O Show

            Meus olhos quase se perderam na multidão. Era gente pra todo lado, quase fico atordoado com tamanha movimentação. Segurei a mão da última pessoa do trenzinho que furava, não sei como, o mar de gente feito uma flecha, ou um tiro de fuzil. Eu achava que chegaria à saída, mas ao contrário do que eu queria, fui levado a cada passo pra mais longe do meu esperado destino.             Fui enganado pelos meus amigos. Eles disseram que era um show do Nando Reis. Eu sou fã do Nando desde a época dos Titãs, banda que perdeu um pouco do meu carinho depois da saída do meu ídolo maior, mas até que Paulo Miklos segurou as pontas, pois não gosto – nada contra – da voz dos outros vocalistas. O show em que eu estava, que por sinal tinha pago quinze reais pra entrar valendo-me do meu direito de estudante, é claro, era do... ou será da? Enfim... era da banda... Calypso (procurei no Google o modo certo de ...

Churrasco Na Lagoa

Certo dia, no Bosque dos Cajueiros, duas famílias próximas combinaram de fazer um churrasco na Lagoa da Leguminosa Doce. Porém, a Família Buscapé, que não tinha ainda achado petróleo no quintal, disse que não iria, pois não tinha carro, e não ficaria na aba de ninguém, mesmo que num tempo passado a Família Malfoy, a outra desta história, havia largado os filhos na casa dos Buscapé, sem aviso prévio nem hora pra voltar – um problema já que matriarca dos caipiras estava de cama com dengue. – Não, não tem problema! A gente quer a companhia de vocês... Faz o seguinte, de sete a gente passa com o Doblò na sua cabana pr’agente ir pra Lagoa da Leguminosa Doce... Fiquem tranquilos, a gente já comprou duas picanhas, três peças de alcatra, além de queijo coalho, linguiça e asa frango. Não precisam levar nada, viu? A gente tem dinheiro, a gente é “ricos”, a gente pode comprar o que bem a gente quiser. Depois que a família Malfoy saiu da casa dos Buscapé, que ficava perto da praia, e, por iss...

Suco de Caju

Acontece desde o dia que me perdi na mata da Barreira. Eu estava a procura de caju, pois me bateu uma vontade enorme bem aqui, no órgão dos desejos, de tomar um suco bem gelado. E como painho pegava todos os cajus dos cajueiros do quintal pra vender quase nunca eu tomava meu suco favorito, que ficava ainda melhor quando mainha fazia. Ela peneirava o suco, adoçava na medida certa. E eu, que nunca tive muita paciência, me desesperava pra fazer e beber logo. Além de recolher os cajus do quintal, meu pai também andava pela mata da Barreira procurando mais frutas para enriquecer a barraca. Ele sabia todas as trilhas, as que eram visitadas por soldados e as que nunca eram lembradas no itinerário dos aviadores. Aprendi com ele a andar por aqueles matos, conhecia todas aquelas trilhas, guardava na memória todas as bifurcações e encruzilhadas, inclusive lembrava ao meu pai do caminho certo quando ele se confundia, por isso não sei como naquele dia eu me perdi. Provavelmente meu pai e os outro...

Pitombo e a mediunidade

Pitombo, que tinha esse apelido por ser loucamente apaixonado por pitomba e esperava o ano inteiro pra saborear a fruta que amava, sofria com ataques de loucura, como dizia a família, inclusive a mãe, e a vizinhança, que sabia mais da vida de Pitombo do que ele próprio... Aliás, vizinhos têm esse dom, o dom de saber mais dos atos, do coração e da cabeça dos outros, mais mesmo do que qualquer confessor, melhor do que qualquer melhor amigo. Pitombo ouvia vozes, ou pelo menos era isso o que ele dizia. Quando não aguentava mais, o coitado se debatia no chão, gritava, esperneava segurando a cabeça com força com as duas mãos empurrando na altura dos ouvidos, como se isso impedisse que as vozes de sua loucura gritando desejos impraticáveis ressoassem como sinos de bronze. Certo dia, um pastor passava pela porta e ouviu os gritos de Pitombo. Ele pediu pra entrar e fazer uma oração, disse que seu deus poderia ajudar aquela alma, que aquilo não era loucura, eram espíritos, ou melhor, obras de...